Marko Massai é um artista de múltiplas facetas, que encontra na mistura de técnicas, culturas e vivências o alicerce de sua identidade criativa. Desde os primeiros rabiscos na infância, quando sua professora percebeu o talento em detalhes que ultrapassavam a normalidade de um menino de sete anos, Marko já desenhava seu próprio caminho no mundo das artes. Aos 11, inspirado por gibis e revistas de games, ele passou a copiar personagens com precisão e paixão, aprimorando sua técnica e aprofundando-se no universo visual. Mas foi aos 13 anos, ao descobrir o grafite no movimento hip hop, que ele encontrou um espaço para expandir sua imaginação do papel para os muros da cidade.
Esse amor pelas paredes e pelo grafite foi mais do que um flerte juvenil. Ele moldou sua adolescência, tornando-o o garoto do bairro que sabia desenhar, aquele que transformava simples pedidos em obras com toques de criatividade. Com o tempo, seu trabalho começou a ganhar uma assinatura própria, impulsionada pelas influências do movimento negro, do hip hop e das lutas sociais. Marko explica que a transição de um artista comercial para um criador com identidade veio apenas aos 20 anos, quando começou a questionar o que realmente queria expressar. Nessa busca por um estilo único, passou a incorporar múltiplas técnicas e texturas, evitando classificações rígidas e celebrando a liberdade como essência de sua arte.
E é essa liberdade que permite a Marko ir além das fronteiras do hip hop. Embora suas obras ressoem com a cultura negra e suas figuras históricas, elas também dialogam com a ancestralidade brasileira e com referências que ele encontra em suas vivências e na comunidade ao seu redor. Ele não apenas pinta personagens como Malcolm X ou Rosa Parks, mas também se dedica a homenagear talentos locais, como DJ Primo, amigo e ícone da cena musical de Curitiba, eternizado em uma de suas telas.
Marko também é adepto do “live painting”, uma expressão artística que une a performance ao processo criativo. Para ele, pintar ao vivo é um espetáculo em si, onde a interação com o público transforma o ato de criar em um diálogo visual. Se no atelier ele encontra solidão e introspecção, nos eventos ao vivo, ele abraça a energia coletiva, adaptando-se ao tempo e às distrações. Essa dualidade o mantém em constante movimento, sempre experimentando novas formas de se conectar com seu público.
Além de artista visual, Marko é DJ e produtor da icônica festa Tamborzão, um projeto que, desde 2014, exalta ritmos africanos como zouk, kuduro e afrobeat em Curitiba. Inspirado por suas experiências com a comunidade africana local, ele criou um espaço de celebração e resistência cultural, mostrando como a música pode construir pontes e diminuir distâncias. Marko acredita que esses ritmos, muitas vezes ignorados no passado, estão finalmente ganhando a atenção merecida, fortalecendo as conexões entre diferentes culturas e valorizando a riqueza da diáspora africana.
Marko Massai compartilhou o impacto de sua participação no curta-metragem Bença, vencedor do prestigioso Prix Courtoujours. A obra, de Mano Cappu, retrata um lado pouco explorado da realidade de pessoas detentas: o afeto, o cuidado e o amor. Para Marko, atuar no filme foi uma experiência de muito aprendizado.
“Conhecer essa realidade foi impactante, porque a mídia tradicional só mostra violência, ódio, sangue. Mas o diretor viveu isso, então ele tinha propriedade para contar. O filme é sobre amor, algo que parece não combinar com esse contexto, mas é o que sustenta as pessoas ali. Para mim, foi uma oportunidade de descobrir uma habilidade que nem imaginava que tinha. Foi um desafio pessoal, um processo de evolução. O cinema me inspirou a explorar outro lado da minha arte”, comentou.
O filme representa um momento crucial na trajetória de Marko, não apenas como artista, mas como alguém que busca desafiar os limites da narrativa dominante sobre a população negra e as pessoas em situações de exclusão.
Marko também destacou a força crescente da nova geração de artistas pretos em Curitiba, conectando esse movimento às sementes plantadas nos anos 1990. Ele explicou que, naquela época, o hip hop e outros movimentos culturais negros já denunciavam o racismo estrutural em uma cidade historicamente marcada pela violência policial e pela marginalização.
“Hoje, essa cena é uma resposta ao sistema, uma libertação pessoal. Antes, os pretos tinham medo da crítica, da violência, do preconceito. Agora, o povo está metendo a cara. O hip hop, em especial, virou uma ferramenta de transformação. É muito gratificante ver tanta gente nova ocupando espaço e mostrando o potencial que temos aqui”, afirmou.
No entanto, ele também ressaltou os desafios que ainda precisam ser enfrentados. Segundo Marko, é essencial olhar para o passado para evitar erros e seguir combatendo a repressão e o racismo.
“Viver da arte não é fácil, mas é a ferramenta que temos para transformar individual e coletivamente. Precisamos nos profissionalizar, estudar, entender as brechas do sistema, os editais, e superar as barreiras burocráticas que afetam nossa comunidade. Não é só sobre dinheiro ou formação: é sobre amor pelo que fazemos, sobre coletivizar e fortalecer uns aos outros. É isso que vai transformar Curitiba em uma referência, como São Paulo no rap ou o Rio no trap e no funk”, concluiu.
Sua trajetória multifacetada reflete uma profunda habilidade de absorver e transformar experiências em arte. Seja como artista, DJ ou produtor, Marko Massai é uma força criativa que celebra a diversidade, quebra barreiras e coloca Curitiba no mapa como um ponto de convergência cultural. Ele não apenas cria arte; ele cria pontes entre histórias, pessoas e mundos, mostrando que o verdadeiro legado de um artista está na capacidade de unir o passado ao presente para transformar o futuro.
Fotos: Fabio Donizete, The Yizzuz e Maria Vitória