No dia 9 de maio de 1898, o Brasil perdia um de seus filhos mais ilustres: André Rebouças. Engenheiro, abolicionista e defensor dos direitos humanos, Rebouças deixou um legado marcante para o país. No entanto, ao completar 125 anos de sua morte, é lamentável constatar que sua memória parece ter sido relegada ao esquecimento.
Nascido em 13 de janeiro de 1838, na cidade de Cachoeira, na Bahia, André Rebouças era filho de Antônio Pereira Rebouças, um escravo alforriado que se tornou um respeitado professor de matemática. Desde cedo, André revelou sua paixão pelas ciências e pela luta contra a injustiça social.
Uma mente brilhante
Após concluir os estudos no Colégio Militar do Rio de Janeiro em 1857, André Rebouças ingressou na Escola de Aplicação da Praia Vermelha, onde se formou em ciências físicas e matemáticas em 1859. Em 1860, ele se tornou engenheiro militar, e o primeiro engenheiro preto do Brasil.
Durante a Guerra do Paraguai, de 1864 a 1866, Rebouças serviu como engenheiro e foi nessa campanha que ele desenvolveu um torpedo autopropulsado, um dos primeiros desse tipo no mundo. Seu torpedo autopropulsado é considerado anterior ao famoso modelo desenvolvido pelo inventor inglês Robert Whitehead. Rebouças tinha dois irmãos, Antônio Pereira Rebouças Filho e José Rebouças, que também eram engenheiros.
Legado na Engenharia
Após retornar do exército em 1866, Rebouças tornou-se diretor da Alfândega do Rio de Janeiro. Nessa função, desempenhou um papel fundamental na construção de inúmeros portos e ferrovias no Brasil. Em 1870, sua criação de um sistema de armazenamento de água salvou vidas durante a crise hídrica na capital. Como diretor da Alfândega, ele projetou e inaugurou as Docas Pedro II, em Valongo, como parte da Modernização dos Portos Brasileiros. Em 1874, Rebouças e seu irmão Antônio projetaram a primeira ponte de concreto armado do Brasil, a Ponte Irmãos Rebouças em Piracicaba.
Com o apoio financeiro do Barão de Mauá, André Rebouças empreendeu o projeto de engenharia mais complexo do Brasil na época, a Estrada de Ferro Curitiba-Paranaguá, construída entre 1880 e 1885 por Antônio Ferrucci e João Teixeira Soares, abrangendo 110 quilômetros de trilhos.
Além de seu trabalho em engenharia, André Rebouças dedicou-se a projetos políticos e econômicos que visavam à modernização da infraestrutura do país. Em seu livro “Agricultura Nacional: Propaganda Abolicionista e Democrática” de 1883, ele defendia a abolição da escravidão, a educação e a reforma agrária para os ex-escravos.
Ele também apoiou a imigração em massa de italianos e portugueses para o Brasil, um país que tinha apenas 14 milhões de habitantes na época. Ele participou da Sociedade Central de Imigração, ao lado do Visconde de Taunay.
Amigo do Imperador
Rebouças, um amigo próximo do imperador brasileiro Pedro II, seguiu a família imperial para o exílio após um golpe de Estado em 1889. Por vários anos, trabalhou como correspondente do jornal londrino The Times enquanto morava em Lisboa, Portugal, onde faleceu em 1898. A morte de Rebouças teve um impacto significativo na Escola Politécnica do Rio de Janeiro, onde ele havia sido professor, e a escola expressou profunda tristeza pela “perda irreparável sofrida pelo ensino superior e pela Engenharia Brasileira” em sua ata.
André Rebouças não se limitou a sua carreira profissional, ele também foi um ativo militante na luta pela abolição da escravidão. Sua atuação incansável na causa o levou a colaborar com importantes líderes do movimento abolicionista, como José do Patrocínio e Luís Gama. Rebouças acreditava que a abolição deveria ser acompanhada de medidas para a integração social e econômica dos pretos libertos, defendendo a educação como ferramenta essencial para a igualdade.
Educação é a maior arma
Sua importância para o movimento preto no Brasil é inegável. André Rebouças foi um dos grandes intelectuais do século XIX, que lutou bravamente contra o racismo e a discriminação. Suas ideias e ações influenciaram gerações de ativistas, que seguiram seus passos na busca por uma sociedade mais justa e igualitária. Além disso, Rebouças foi um defensor incansável do progresso científico e tecnológico.
Esquecimento de um ídolo
No entanto, é triste constatar que a figura de André Rebouças parece ter saído dos holofotes ao longo dos anos. Seu nome não recebe a devida reverência e sua história é pouco conhecida pela maioria dos brasileiros. Avenidas e ruas com seu nome aparecem em diversas cidades do Brasil, mas raramente nas mesmas transita sua história magnífica.
Esse apagamento é um reflexo do descaso com que a história de importantes personagens pretos tem sido tratada em nosso país.
É fundamental resgatar a memória de André Rebouças e de tantos outros heróis pretos que contribuíram para a construção do Brasil. A história desses homens e mulheres deve ser contada e celebrada, para que as novas gerações tenham referências positivas e conheçam a verdadeira história do nosso país.
Como afirmou a historiadora Ana Flauzina, “André Rebouças é um nome que precisa ser resgatado, estudado e reconhecido como parte importante da construção da história do Brasil. É um símbolo de luta, perseverança e resistência negra.”
VIVA ANDRÉ REBOUÇAS!
imagens: C&T, MAAV, Valle Junior, Zappeando, Casa e Jardim e Curitiba Space.